sábado, 17 de dezembro de 2016

Irmão Antônio Cechin: a estrela de Belém, o lunar de Sepé

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“Alguns magos do Oriente chegaram a Jerusalém, e perguntaram: ‘Onde está o recém-nascido rei dos judeus? Nós vimos a sua estrela no Oriente, e viemos para prestar-lhe homenagem’. E a estrela, que tinham visto no Oriente, ia adiante deles, até que parou sobre o lugar onde estava o menino. Ao verem de novo a estrela, os magos ficaram radiantes de alegria. Quando entraram na casa, viram o menino com Maria, sua mãe” (Mateus 2. 2, 9-11).

Neste tempo de celebrações do Natal, muito se recorda a passagem bíblica da chamada estrela de Belém, que foi vista pelos magos no Oriente e que os conduziu ao lugar onde estava o recém-nascido, o Menino Deus, em Belém, na Judeia, conforme relata o Evangelho segundo São Mateus 2. 1-12. E aqui no Sul temos “O Lunar de Sepé”, contada na forma de verso em Contos Gauchescos, por Simões Lopes Neto. No caso da estrela de Belém, ela conduziu os magos no caminho que os levou ao Menino Jesus, considerando os devidos cuidados diante das más intenções do rei Herodes. E o lunar de Sepé foi um sinal no semblante do índio Guarani, Sepé Tiarajú, que conduzia seu povo na luta contra as “armas de Castela / que vinham do mar de além” e em defesa e preservação da terra missioneira. O lunar de Sepé para os Guarani representava um sinal da presença de Deus. Mas, para seus inimigos, como foi com Herodes, no tempo do nascimento de Jesus, era o sinal a perseguir para combater o projeto de Deus. Após a morte de Sepé, o lunar continua resplandecendo, só que agora no céu, como um sinal de luz a guiar o povo Guarani e a quem acredita e luta pela terra sem males.

Então, Sepé foi erguido
Pela mão de Deus-Senhor,
Que lhe marcara na testa
O sinal do seu penhor!
O corpo, ficou na terra...
A alma, subiu em flor!...

E, subindo para as nuvens,
Mandou aos povos benção!
Que mandava o Deus-Senhor
Por meio do seu clarão...
E o lunar na sua testa
Tomou no céu posição...

Nos tempos atuais, onde se manifesta a estrela de Belém e onde brilha o lunar de Sepé? Acredito que são a mesma fonte de luz que não podemos tocar com as mãos nem fixar sobre ela nosso olhar. Uma fonte de luz que está em muitos lugares e brilha no exemplo de vida de muitas pessoas. A estrela de Belém e o lunar de Sepé são vidas humanas que nos mostram o projeto de Deus. Pessoas que são como “o sal da terra” e “a luz do mundo” (cf. Mateus 5. 13-14).
É, pois, assim que hoje posso definir a vida de Irmão Antônio Cechin.
No lugar que Cristo lhe preparou, agora brilha como uma estrela que conduz o mundo pelos caminhos da justiça e da paz, do amor e do bem viver, na luta pela terra sem males. Sua vida é mais que uma trajetória de começo, meio e fim. É uma vida que permanece viva e impulsiona nosso viver. A história que iniciou no nascimento de uma criança, em 17 de junho de 1927, não termina com a morte de um homem aos 89 anos, no dia 16 de novembro de 2016. Irmão Antônio Cechin é uma vida que revigora nossos sonhos, fortalece nossas esperanças e resgata nossa humanidade. Portanto, continua vivo, presente.
Sua vida é uma caminhada de fé, amor e respeito aos índios, catadores, camponeses, sem-terra, desempregados e todos os pobres e a natureza. Irmão Cechin sempre será lembrado como um discípulo de Cristo que viveu o Evangelho como palavra de Deus na língua humana de todas as culturas, como presença e história de Deus na história dos povos.
E, como disse Bertolt Brecht sobre as pessoas que lutam: “Há aqueles que lutam um dia e são bons, há outros que lutam um ano e são melhores, há os que lutam muitos anos e são muito bons. Mas há os que lutam toda a vida e estes são imprescindíveis”. Irmão Antônio Cechin está entre homens e mulheres que são imprescindíveis, não somente pelo bom resultado de sua luta, mas porque sua vida impulsiona outras pessoas a seguirem lutando.
E pela analogia, que aqui procuro fazer, da vida de Antônio Cechin com a estrela de Belém e o lunar de Sepé, quero dizer que este ser humano imprescindível, nosso irmão de fé, nosso companheiro de lutas, é, sem dúvida, um facho de luz que continua a clarear nossos passos, um farol que segue a nos mostrar o caminho. 
Reverendo Pilato Pereira - IEAB
  
Porto Alegre, 16 de dezembro de 2016,

Um mês da morte de Irmão Antônio Cechin

terça-feira, 4 de outubro de 2016

A Igreja e os pequenos agricultores

POR UMA NOVA PRIMAVERA DAS IGREJAS - A Igreja e os pequenos agricultores
por Dom Orlando Dotti
A Mater et Magistra, a encíclica que mais longamente aborda o tema da agricultura, em seu número 144 afirma: “Estamos persuadidos de que, em matéria de agricultura, os principais agentes e promotores do desenvolvimento econômico, da elevação cultural e do progresso social devem ser os diretamente interessados, isto é, os próprios agricultores”. Doutro lado, a Gaudiam et Spes, no número 66, assim se expressa: “Tendo em conta as especiais dificuldades da agricultura em muitas regiões, quer na produção, quer na comercialização dos produtos, é preciso ajudar os agricultores, no aumento e na venda da produção, na introdução das necessárias transformações e inovações e na obtenção de um justo rendimento; para que não continuem a ser, como muitas vezes acontece, cidadãos de segunda categoria”.  
Ambos os textos afirmam a mesma coisa: o agricultor deve ser o protagonista de sua própria ascensão social e de suas organizações. Diante disso, torna-se imperativo perguntar: “Qual o papel da Igreja juntos aos pequenos agricultores?” Vamos tentar responder por partes.
Pelo que consta, os primórdios do cristianismo tiveram sua base nas periferias das grandes cidades. Os moradores do interior, dos “pagos”, também chamados de “pagani”, eram os nãos cristãos: os pagãos. Mais tarde, os papéis se inverteram, e a Igreja teve, prevalentemente, um rosto rural.
Isso também aconteceu no Rio Grande do Sul, de modo especial, desde a imigração no século XIX. As cooperativas de crédito, fundadas pelo Pe. Amstadt vigoraram entre os pequenos agricultores. À sombra das pequenas capelas do interior, surgiram e se consolidaram as organizações agrícolas. Duas entidades de Igreja, a FAG e a Pastoral da Terra, foram decisivas na fundação dos sindicatos, cooperativas, associações e ONGs rurais. 
Dentro desse processo histórico, que papel jogou e joga a Igreja junto às entidades de classe e às associações de produção dos agricultores? 
Esmiuçadamente, tentaremos responder a essa pergunta. A Igreja ofereceu seu espaço físico para as reuniões dos agricultores. Foi nos salões do interior e das sedes paroquiais que a agricultura familiar encontrou sua guarida. Espaço gentilmente oferecido e bem aproveitado pelos agricultores. 
Em segundo lugar, a Igreja ofereceu e oferece pessoas para estarem junto aos agricultores: padres, pastores, agentes de pastoral, técnicos,... A força de credibilidade da Igreja passou aos agricultores. Nesse trabalho todo, nossas igrejas sempre valorizaram mais o processo do que o resultado, evitando o imediatismo e a improvisação.
Mais que tudo isso, a Igreja ofereceu aos agricultores “uma cesta básica” de princípios e de valores, como orientativos em sua ação. O próprio agricultor sempre foi fiel seguidor da Igreja, acatando suas orientações e a iluminação bíblica que vem dela. A fé sempre foi sua lei e norma de vida. A partir disso, não foi difícil dar-lhe a conhecer e a viver a grande verdade de que o agricultor é alguém que goza plenamente da dignidade de pessoa humana e, por isso mesmo, merecedor de todo apreço, estima e atenção. O agricultor é plenamente cidadão como todos os demais, e não rebaixado, como muitos quereriam, a uma segunda categoria. 
Depois disso, a Igreja procurou e procura sensibilizar o agricultor para a solidariedade. “Juntos somos mais”. Todas as organizações sociais têm sua raiz na solidariedade, contra o capitalismo selvagem que privilegia o individualismo. 
A participação é outro princípio muito em voga, hoje. Estende-se à atividade social e política do agricultor. Participar é sinal de compromisso com o bem-comum.
O princípio de subsidiariedade deve ser tomado muito em conta por parte dos agentes de pastorais. Nunca tirar a vez do agricultor. Estar pronto para ajudá-lo, sem nunca substituí-lo. Quando o agricultor não tem nada a dizer, é melhor fazer silêncio do que falar por ele. Creio que um outro papel da Igreja é ser instância crítica junto às organizações rurais. Há sempre a possibilidade de descaminhos na organização social, que se manifestam quando se deixa de lado o bem-comum para atender os interesses pessoais. Diante disso, a voz da Igreja não pode se calar. A profecia não pode morrer. 
As Romarias da Terra, do norte ao sul do país, têm a finalidade de congregar os agricultores, pôr em comum seus problemas, discuti-los e projetar uma vida melhor para todos, enfocando a cada ano novos temas, com novos protagonistas e nova simbologia. 
As Romarias da Terra constituem-se em presença qualificada da Igreja junto à multidão dos agricultores que delas participam e que lutam por mais vida, qualidade de vida e cidadania. 
*Bispo Emérito de Vacaria e Fundador da Comissão Pastoral da Terra. Acompanha desde o inicio a Comissão Pastoral da Terra do RS, hoje como Conselheiro.
(texto escrito para a 36ª. Romaria da Terra do Rio Grande do Sul)

Combate aos Impactos dos Agrotóxico

No último dia 21 de setembro em Encantado - RS aconteceu Audiência Pública do Fórum Gaúcho de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos para debater e propor encaminhamentos a respeito do uso abusivo de agrotóxicos e seus efeitos no meio ambiente e saúde dos consumidores de 34 municípios do Vale do Taquari. 

A Comissão Pastoral da Terra - CPT /RS junto com a Articulação De Agroecologia Do Vale Do Taquari -Aavt auxiliaram na organização do encontro se manifestaram em defesa das sementes crioulas e da agroecologia como forma de combater o uso abusivo de agrotóxicos e demostraram preocupação com a contaminação e extermínio das sementes crioulas pelas sementes transgênicas e o pelo uso indiscriminado dos agrotóxicos . "Quem vai garantir o direito dos agricultores de cultivar sementes sadias?"

Além da presença dos agricultores e das agricultoras, e de consumidores, o encontro contou com representantes de órgãos públicos, associações civis, estabelecimentos de saúde, conselhos, universidades e movimentos sociais.

Audiência foi uma reivindicação dos agricultores e agricultoras da região do Vale do Taquari, que vem sofrendo com a morte de abelhas e perdendo a produção em virtude do uso abusivo de agrotóxicos por alguns grandes produtores da região.

Texto enviado por CPT-RS
Fotos: Articulação De Agroecologia Do Vale Do Taquari - Aavt

segunda-feira, 5 de setembro de 2016

Grito dos Excluídos 2016

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NOTA PÚBLICA - Democracia golpeada, Povo em luta!

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"Mas o golpe está só no começo. Esta elite exige um pacote de reformas que serão o verdadeiro golpe aos direitos sociais e trabalhistas. O discurso de Temer, ao assumir a efetividade da presidência, deixou claro a que veio, qual seu projeto, a quem serve". Confira Nota Pública divulgada pela diretoria e coordenação executiva nacional da CPT sobre o golpe contra a democracia no Brasil:



A Diretoria e a Coordenação Executiva Nacional da Comissão Pastoral da Terra, no decorrer dos últimos meses mais de uma vez se manifestou sobre a crise política que o país vive. Hoje com o desfecho final do processo de afastamento da presidenta Dilma volta a se manifestar.

Efetivou-se o golpe e a vergonhosa anulação do povo no seu direito de ser governado por quem ele escolheu. Interrompeu-se a democracia com doses agudas de cinismo e traição. Instaurou-se um regime de exceção não declarado, que faz temer pelo futuro.

A CPT sempre se manifestou criticamente em relação aos últimos governos e seus muitos erros e poucos acertos, e por terem se rendido ao jogo das barganhas escusas entre políticos profissionais e empresários. Com isso não responderam aos anseios e necessidades mais profundas da população, por participação e direitos, como prometeram. Em especial os camponeses e camponesas, os sem-terra e, sobretudo, os povos indígenas, os quilombolas e outras comunidades tradicionais, foram preteridos no balcão dos negócios em que se chafurdou a política.

Mas o desfecho do processo é uma afronta à democracia. O fato de os senadores terem votado por manter os direitos políticos da presidenta afastada, deixa claro sua incoerência. Só queriam seu lugar por razões políticas inconfessas, mas que todos sabem. Foi impedida uma presidenta que não praticou crime de responsabilidade comprovado.

Na verdade o que se viu não foi um julgamento, mas o cumprimento de um rito formal e vazio de sentido democrático. O destino de Dilma Rousseff já havia sido acertado entre perdedores das últimas eleições e ex-governistas traidores. A elite empresarial e financeira que deu suporte ao processo cobrou a fatura ao Congresso Nacional. Incapaz de chegar ao poder pela via eleitoral, assalta-o pelo golpe, num monumental e reincidente desprezo pelo povo, o eleitor. Formalidades cumpridas, não se poderia classificar o ato como golpe, é o que tentam fazer o povo crer.

Mas o golpe está só no começo. Esta elite exige um pacote de reformas que serão o verdadeiro golpe aos direitos sociais e trabalhistas. O discurso de Temer, ao assumir a efetividade da presidência, deixou claro a que veio, qual seu projeto, a quem serve.

São três os principais golpes que afetam diretamente a vida do povo.

Reformas no direito do trabalho, com prevalência dos acordos entre patrão e empregado sobre a legislação trabalhista e favorecimentoda terceirização de atividades, aposentando a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

Reformas na previdência ampliando a idade mínima para aposentadoria e desvinculando do salário mínimo o reajuste da mesma E o golpe, tanto ou mais grave que os acima citados contra a Constituição, como propõe a PEC 241 de congelar o investimento público por 20 anos, atingindo gastos com educação, saúde e programas sociais.

Ademais, ao sacrificar novamente as populações do campo e das florestas, plantando divisão entre os movimentos camponeses para enfraquecê-los, anuncia-se uma reforma agrária cosmética, para facilitar a entrega de terras a estrangeiros e internacionalizar ainda mais o agronegócio. E para impor as reformas e reprimir resistências, criminalização e violência contra os movimentos e ativistas sociais, como já está acontecendo.

Se são tempos escuros os que vivemos, mais ainda os que virão no futuro próximo. Mas fazemos nossas as candentes palavras do antropólogo Carlos Rodrigues Brandão: “Essa hora é escura, mas é agora o momento de contra o escuro acender as luzes claras de nome esperança, e do chão levantar e se erguer”. Essa é a hora das ruas, praças e estradas do país, da luta e da resistência a se “somar com a ternura, a coragem e o sentido, o valor e o sabor” de quem sabe que a História é o povo quem faz, com festa, mesa partilhada, música e dança, mas também com lágrimas, suor e sangue, quando é preciso. “A hora é agora. Vamos juntos recriar a vida e da vida ... expulsar o medo, transformar o mundo”.

O IV Congresso Nacional que a CPT realizou no ano passado em Rondônia tinha como lema “FAZ ESCURO, MAS EU CANTO”, verso do poeta Thiago de Mello. Hoje, apesar de tudo cantamos, pois acreditamos que é da planície, das lutas do povo do campo da cidade, e não do Planalto que virão as mudanças que o Brasil continua a precisar.

Goiânia, 02 de setembro de 2016,

Semana da Pátria.

A Diretoria e Coordenação Executiva Nacional da Comissão Pastoral da Terra 

Mais Informações:
Cristiane Passos (62) 4008-6406 / 99307-4305
Antônio Canuto – (62) 4008-6412

sexta-feira, 5 de agosto de 2016

Fórum sobre Meio Ambiente

COMISSÃO PASTORAL DA TERRA REALIZARÁ FORUM SOBRE MEIO AMBIENTE- DIA DE CAMPO

DIA:  16.08.2016 -  HORAS: 09:00 ÀS 16.
LOCAL:  ASSENTAMENTO DE RONDINHA-ESCOLA-  JÓIA
NO GINÁSIO: Exposição: Colheita Venenosa- EMATER
PAUTA:
- MANHÃ: - CACON- Efeitos do veneno na saúde humana
- Volnei Prof. Da UNIJUI- A Saúde na Terra,
- TARDE:     - TENENTE Fernando: Consequências do uso do veneno;
 EMATER: As alternativas- VOLNEI: Cuidado com a terra

Na ESCOLA: Experiências de Batata doce e variedades de mandioca.
VISITAS de outras escolas......
Coordenação:  Adilio Perin e Ir. Norma Knob

sexta-feira, 29 de julho de 2016

JORNADA DE INTEGRAÇÃO CAMPO E CIDADE: ECOS DE UMA ECOLOGIA INTEGRAL

A articulação das Pastorais Sociais, da qual a Comissão pastoral da Terra faz parte, juntamente com a Cáritas Arquidiocesana, Feira Ecológica, Coonalter e Pastoral da Juventude Rural promoveram a 1ª Jornada de Integração Campo e Cidade, no dia 16 de julho em Passo Fundo. O principal objetivo é fortalecer e valorizar os agricultores e agricultoras agroecológicos, articulando saberes, sabores e práticas. As bancas temáticas e atividades deixaram marcas e compromissos. 
Feira Ecológica
Já é tradicional em Passo Fundo a Feira Ecológica. Pequenos agricultores e agricultoras da região, organizados em pequenos grupos, produzindo de forma agroecológica, oferecem a comunidade passo-fundense alimentos orgânicos e saudáveis. Segundo a Professora Dr. Claudia Petry, da Universidade de Passo Fundo, que esteve participando da atividade: “somos o que comemos”. A relação entre a saúde e a alimentação é intrínseca e determinante para nossas vidas. 
Para Maristela, uma das agricultoras feirantes, o que garante a produção e a vitalidade da feira é a relação que se estabeleceu entre os produtores e os consumidores. Segundo ela, existe “um cuidado mútuo na medida em que se produz pensando no consumidor e se consome pensando no produtor”. Quem ganha com os alimentos orgânicos não é somente o ser humano, mas toda a natureza, que vê seus ciclos respeitados. Um dos problemas que os agricultores ecológicos citam é com relação às políticas públicas para a agroecologia, pois existe um abismo entre o potencial financeiro investido no agronegócio e o investimento na agroecologia.
Economia Solidária e Alimentação Nutritiva 
A Cáritas Arquidiocesana enriqueceu a Jornada com a presença de grupos de economia solidária. “Eco”, do grego oikos, significa “casa” e “nomia” do grego nomos, significa norma. O termo “economia” carrega em seu significado a organização da casa comum. A economia solidária é uma alternativa frente ao modelo neoliberal de acúmulo e concentração de riquezas. É organizada em redes e grupos que produzem e comercializam numa lógica de partilha, responsabilidade ambiental e social. 
Pensar uma ecologia integral é agregar toda a caminhada já construída pelos grupos da economia solidária. Diretamente ligada a agroecologia, a esta forma de economia é vivida por grupos do campo e da cidade. A Cáritas dispõe de informações e pode ajudar a população a ter acesso com mais intensidade aos produtos e aos grupos solidários.
Além disso, a banca, também proporcionou diálogos sobre alimentação nutritiva e cuidados alternativos com a saúde. A Pastoral da Saúde esteve presente com indicações de chás e remédios caseiros, de modo especial na linha preventiva. Para os agentes da Pastoral da Sáude, tão importante quanto à cura de doenças é sua prevenção. Por isso, a importância da medicina alternativa e da alimentação nutritiva e saudável. 

SEMENTES CRIOULAS 
O cuidado com a Terra e a produção de alimentos saudáveis passa também pelo resgate e preservação das sementes crioulas. 
A Equipe da Comissão Pastoral da Terra do Rio Grande do Sul – CPT, esteve presente na Jornada acompanhada de agricultores e agricultoras de Santa Cruz do Sul integrantes do Banco de Sementes Crioulas daquela Diocese, e que apresentaram a experiência aos participantes da Jornada. Coordenador do Banco, o técnico em agropecuária Maurício Queiroz, 37 anos, que também integra a equipe de coordenação da CPT – RS, respondeu algumas perguntas para a página da Ação Social da Igreja.
-Maurício, qual é a importância de se falar em sementes crioulas atualmente?
Eu acho fundamental, por que com a repercussão das sementes crioulas temos a possibilidade de produzirmos alimentos diversificados e ecológicos. Através delas podemos chamar atenção para a importância da agricultura de base ecológica que é desenvolvida em harmonia com a natureza. Ao preservar as sementes crioulas e produzir seguindo os princípios da agroecologia, estamos produzindo alimentos sem destruir a casa comum, na qual nossa espécie é apenas um morador. Existe uma grande biodiversidade a ser preservada e, dentro dela, a agrobiodiversidade das sementes crioulas. 
-O que são sementes crioulas?
Sementes crioulas, também conhecidas por sementes comuns, tradicionais ou caseiras, são as sementes tradicionalmente produzidas pelos agricultores e agricultoras. Com elas evoluíram nestes milhares de anos de existência da agricultura, razão pela qual são chamadas de Patrimônio dos Povos. Eles são a base da produção dos nossos alimentos. Não da para falar de sementes crioulas sem falar de agricultor, agricultora, campesino, povos indígenas. Há uma simbiose entre eles e as sementes. Junto com as sementes crioulas também estão mudas de plantas, raças de animais crioulos. Todos eles precisam ser preservados. 
-Em que elas se diferenciam das sementes híbridas e transgênicas?
A principal diferença diz respeito ao controle. As crioulas estão nas mãos dos agricultores que com ele evoluíram naturalmente sem qualquer modificação genética e laboratório, garantindo-lhes autonomia e segurança alimentar. Já as híbridas têm como donos as grandes multinacionais. São desenvolvidas em laboratório e casadas ao pacote de agroquímicos. É bom lembrar que para produzir híbridos são necessárias sementes crioulas, que são a base. 
¬-É possível coadunar sementes crioulas com agronegócio? Ou as duas são excludentes entre si?
Não combinam; são modelos completamente antagônicos. As sementes crioulas combinam com agroecologia, com diversidade, economia local, produção de alimentos, com partilha da terra, com alimentação saudável. Aliás, comida de verdade só é possível com sementes de verdade, que são as crioulas. 
O que é um banco de sementes crioulas?
É uma estratégia encontrada por comunidades de agricultores e agricultoras para manter sementes crioulas na produção de seus alimentos. As propriedades dos agricultores sempre foram “bancos de sementes crioulas” e isso precisa voltar a acontecer. Dai se estimula que as famílias organizem num espaço comum para manter as sementes. Isto é um Banco de Sementes Crioulas.

MANIFESTO CONTRA OS ALIMENTOS TRANSGÊNICOS E A FAVOR DA SEGURANÇA ALIMENTAR

O recente relatório a respeito dos transgênicos efusivamente propagandeado em horário nobre pela grande mídia teve como óbvio interesse de tranquilizar os consumidores. Com o objetivo de dar uma versão pretensamente científica, por todos os cantos do planeta ouviu-se a afirmação de que “alimentos transgênicos não fazem mal à saúde”. Porém nós, entidades, agricultores e consumidores, que defendem a alimentação saudável, queremos dizer à sociedade que não concordamos com essa afirmação, pois sabemos que existem vários estudos que, DE FORMA CIENTÍFICA, apontam para os riscos da ingestão dos alimentos transgênicos à saúde.
O tal relatório não fez nenhuma pesquisa, mas uma junção de dados e concluiu tendenciosamente que não haviam provas de que os transgênicos fazem mal. Porém, escondeu-se o fato de que não provar o malefício não significa provar que é seguro. Continuamos a entender que o princípio da precaução deve reger toda a nova tecnologia criada pelo homem, especialmente no que diz respeito a alimentação humana e que as pesquisas desse caráter normalmente são superficiais.
Será que os autores do relatório analisaram os estudos que indicam os efeitos nocivos dos transgênicos a saúde? Ou, como já ocorreu outras vezes, esses estudos foram ignorados? No livro “Lavouras Transgênicas: riscos e incertezas” estão descritos mais de 750 estudos que são sumariamente desprezados pelos órgãos reguladores. A consistente pesquisa francesa de Seralini de 2014 observou relação entre o consumo de transgênicos e o aparecimento de TUMORES MALÍGNOS em cobaias. Por que isso não está sendo divulgado?
A divulgação bombástica do relatório, nesse momento, não tem relação com novas descobertas, mas, possivelmente com os acontecimentos que arranharam a imagem dos transgênicos nos últimos tempos: a mudança de posição de pesquisadores, como o canadense Thierry Vrain que, de fervoroso cientista a favor tornou-se um combatente dos transgênicos indo a público expor as mentiras da propaganda da indústria de biotecnologia; o manifesto dos 815 cientistas de 82 países pedindo a suspensão dos transgênicos em todo o mundo; o despertar de consciência da sociedade de vários países exigindo rótulos nos alimentos transgênicos; a guerra comercial contra a postura da Europa de querer comer alimentos seguros e não importar transgênicos; entre outros.
Por tudo isso, as Articulações de Agroecologia do Vale do Taquari e do Vale do Rio Pardo e os participantes do 16º Encontro Diocesano de Sementes Crioulas vêm a público manifestar que não aceitamos o relatório e a propaganda pró-transgênico e propomos que a sociedade tampouco aceite. Repudiamos a forma com que a CTNBio guiada por interesses econômicos, avalia e libera essas sementes. Ao invés disso, queremos mais pesquisa séria e menos liberação comercial dessa tecnologia pois ninguém quer ser cobaia dos alimentos da engenharia genética.

Arvorezinha, 27 de julho de 2016.





sexta-feira, 20 de maio de 2016

9° Encontro de Sementes Crioulas de Arroio do Meio avalia alimentação

O Município de Arroio do Meio realiza desde 2008 seu encontro anual de valorização das sementes crioulas. Todos aqueles que buscam resgatar e preservar sementes, tirando proveito de suas potencialidades, são convidados a participar. Para participar do encontro, os interessados devem colaborar trazendo sementes e mudas crioulas para trocar, algum alimento saudável para a confraternização, ou receitas e experiências para partilhar. 
O 9º Encontro de Sementes Crioulas de Arroio do Meio será realizado no dia 25 de maio de 2016, quarta-feira, véspera do feriado de Corpus Christi, onde os participantes serão recepcionados a partir das 13h. O local é o mesmo das edições anteriores: o Salão Paroquial da Comunidade Católica de Arroio do Meio. 
“O Valor Nutritivo dos Alimentos Orgânicos” será o tema deste ano e contará com palestra da nutricionista Joice Johann Bordignon, da Secretaria Municipal da Educação. Também estarão presentes duas jovens da Alemanha que farão um depoimento sobre o consumo de alimentos orgânicos naquele país.
A promoção é das Comunidades Católica e Evangélica de Confissão Luterana, Sindicato dos Trabalhadores Rurais, Secretaria Municipal da Agricultura, Grupo dos Agricultores Ecologistas de Forqueta, Comissão Pastoral da Terra, Associação Ecobé e Emater. O evento conta com o apoio da Secretaria Municipal da Educação e da Articulação de Agroecologia do Vale do Taquari e faz parte das comemorações da Semana Brasileira do Alimento Orgânico.

segunda-feira, 4 de abril de 2016

Encontro Estadual de Povos e Comunidades Tradicionais

IV ENCONTRO DOS POVOS E COMUNIDADES TRADICIONAIS
“Na diversidade a solidariedade transformadora”
Os povos e comunidades tradicionais têm sido permanentemente espoliados de seus direitos de viver na e da terra, em paz e harmonia. Foram e continuam sendo pressionados e expulsos da terra pelo avanço do agronegócio e dos grandes projetos de mineração, hidrelétricas rodovias, hidrovias e outros tantos projetos do grande capital.
E é nesse contexto que a Comissão Pastoral da Terra promove o Encontro Estadual de Povos e Comunidades Tradicionais que tem como objetivo proporcionar encontro e troca de experiências entre Comunidades Tradicionais do Rio Grande do Sul: Indígenas, Quilombolas, Ribeirinhos e Pescadores visando fortalecer a luta e organização conjunta para fazer avançar a construção de um novo projeto para o país, onde sejam respeitadas e valorizadas as diversidades culturais, as sabedorias seculares, as formas de viver e conviver com a natureza e todas as formas de vida, com justiça social e dignidade.
O Encontro de Povos e Comunidades Tradicionais, que está em sua IV edição, é um espaço de estímulo e reforço do protagonismo dos povos e comunidades participantes, um momento de formação e de divulgação de suas vitórias no combate das injustiças.

DATA: 28 de MAIO de 2016
LOCAL: QUILOMBO RINCÃO DOS NEGROS, Rio Pardo/ RS

TROCA DE EXPERIÊNCIAS: cada grupo, comunidade, quilombo, aldeia indígena, grupo de pescadores, que participará do encontro é convidado a trazer painel com os dados da realidade do seu grupo/povo para o momento de partilha.

ALIMENTAÇÃO: àqueles que têm possibilidade são convidados a levarem alimentos para partilhar. A comunidade do Quilombo organizará as refeições que prevê contribuição espontânea dos participantes.

CULTURA: haverá momento para apresentações culturais, música, dança.

PROGRAMAÇÃO 
8h30min - Acolhida
9h - Abertura - mística e espiritualidade, apresentação dos participantes.
10h - VER – partilha da realidade
11h30min - JULGAR – Debates e questionamentos
12h30 - Intervalo almoço
13h - Manifestações culturais, música e dança
14h - AGIR – A partir das realidades ouvidas, como nos organizar?
15h - Encaminhamentos concretos/trabalhos em grupos.
16h - Avaliar/Celebrar
16h30min – Encerramento

É importante que comuniquem com antecedência quem participará representando o grupo/povo, quilombo, aldeia, comunidade.

INSCRIÇÕES E INFORMAÇÕES COMPLEMENTARES contato via telefone ou e-mail: 
- Comissão Pastoral da Terra RS com Simonne (54) 9912 5146 ou cptdors@gmail.com
- Equipe CPT Santa Cruz do Sul
com Oldi Helena Jantsch (51) 9146 6134 
com Maurício Queiroz  (51)969 93640 ou penaterra@ibest.com.br

São nossos apoiadores nesse IV Encontro:
Conselho Indigenista Missionário – CIMI Sul
Quilombo Rincão dos Negros
ASDISC Santa Cruz do Sul
Cáritas RS

Acolhemos a Todas e Todos com Carinho! 
Sejam Vindas e Bem Vindos!

Nosso Abraço Fraterno
COORDENAÇÃO DA COMISSÃO PASTORAL DA TERRA RS

terça-feira, 22 de março de 2016

Encontro Estadual de Povos e Comunidades Tradicionais

DATA: Sábado, 9 de abril às 8:30 - 16:30
NOVA DATA: 28 de MAIO de 2016
LOCAL: Quilombo Rincão dos Negros - Rio Pardo RS

Encontro e troca de experiências entre Comunidades Tradicionais do Rio Grande do Sul, Indígenas, Quilombolas, Ribeirinhos e Pescadores visando fortalecer a luta e organização conjunta.

"É importante fazer inscrição prévia."

INFORMAÇÕES e INSCRIÇÕES: 
Comissão Pastoral da Terra RS 
cptdors@gmail.com ou (54) 9912 5146 
Equipe CPT Região Santa Cruz Do Sul
Maurício Queiroz penaterra@ibest.com.br (51) 96993640 
Oldi Jantsch (51) 91466134 

TROCA DE EXPERIÊNCIAS: cada grupo, comunidade, quilombo, aldeia indígena, grupo de pescadores, que participará do encontro é convidado a trazer painel com os dados da realidade do seu grupo/povo para o momento de partilha.

ALIMENTAÇÃO: àqueles que têm possibilidade são convidados a levarem alimentos para partilhar. A comunidade do Quilombo organizará as refeições que prevê contribuição espontânea dos participantes.

CULTURA: haverá momento para apresentações culturais, música, dança.

quinta-feira, 17 de março de 2016

Celebração Ecumênica em defesa do Rio Uruguai

 No último dia 12 aconteceu em Alba Posse na Argentina, a Celebração Ecumênica em defesa do Rio Uruguai. Na ocasião, o Pe. Leonardo Lunkes, representou a equipe de coordenação da CPT na, onde estiveram presentes várias lideranças religiosas e pessoas das comunidades da região de Santo Ângelo, bem como Dom Liro Meurer, Bispo de Santo Ângelo. A celebração é um dos momentos de mobilização das comunidades dos dois países na luta pela defesa do Rio Uruguai e contra a construção de barragens.



quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

De semeaduras, cultivos, colheitas e consagrações

por Andrei Thomaz Oss-Emer*
A vida é feita de semeaduras. A semeadura, é aquele tempo em que a Terra, com seu seio preparado para acolher a vida, recebe as sementes, patrimônio universal dos povos da Terra. A Terra, tudo acolhe, tudo gera, lança a força vitalícia de minerais obtidos pelo processo de decomposição, graças às milhares de vidas que habitam o seio da Terra. Na Terra semeamos, semeamos a esperança, de novos ciclos, cheios de fartura, para matar toda a fome da Terra.
A água, regando o seio fértil da Grande Mãe, a Casa Comum, Pachamamma, Madre Terra, garante a fertilidade do solo Sagrado. O minuano, que corre pelos campos e traz do sul as chuvas de inverno, irriga essas terras, hora quentes, hora geladas. A luz e o calor do Sol, astro Rei, que nos visita diariamente em sua jornada sideral, garante a energia necessária para que o tempo de maturação aconteça. Nada acontece e nada deve acontecer fora de seu ciclo, os ciclos da natureza são formam um elixir homeopático de esperança, no combate à ansiedade provocada por esses tempos pós-modernos.
O ser humano que aprende dos tempos de cultivo, cultivar a esperança, pode estar pronto para acolher os tempos de colheita. A colheita, é parte do processo, pois tudo se colhe, e todos os dias existem momentos de colheita. A biodiversidade nos garante um processo constante de colheitas, algumas maiores, outras menores, todas são o final de um ciclo, e o começo de outro. A espera, para a nova semeadura, o cuidado com a vida no solo que se recompõe, sempre, cotidianamente.
A fartura da colheita, enche a casa de alegria, pois na colheita está o alimento, ele enche a vila de alegria, pois a alegria com a generosidade da mãe Terra, nos abre o coração para a partilha. A colheita representa a Sagrada reverência diante dos frutos da Terra, somente quem cultiva a Terra tem o sagrado direito de colher dos seus frutos. Os frutos colhidos, são consagrados na mesa das famílias, que são solidárias na partilha dos frutos da Terra, não como quem os consome, mas como quem os comunga, e com eles comunga com a Terra e com os Filhos da Terra. A Terra, enquanto casa de toda a vida, é de si mesma, e por si mesma gera toda a vida que se organiza em sua atmosfera. O Cuidar da Terra perpassa todas as dimensões humanas, cuidando da Terra, a Terra nos cuida, assim como cuida dos sagrados tempos de semeaduras, cultivos, colheitas e consagrações.  
*Andrei Thomaz Oss-Emer é Bacharel em Filosofia Pela Universidade Federal de Pelotas. Mestrando em Filosofia pela Universidade Federal de Pelotas. Educador na Escola São Francisco de Assis – Pelotas-RS – Rede SCALIFRA-ZN. Colaborar da Comissão Pastoral da Terra/ RS. 
 Foto - arquivo CPT/RS 

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

No coração do latifúndio gaúcho, trabalhadores celebram a terra e o herói indígena Sepé Tiaraju

Concentração de cerca de 12 mil pessoas ocorreu na Romaria da Terra, em São Gabriel, na Fronteira Oeste do Rio Grande do Sul.
Foto: Leandro Molina
10 de fevereiro de 2016 19h39
Por Catiana de Medeiros - Da Página do MST

“Este é um momento de reflexão, oração e agradecimento por tudo o que a terra nos dá. É onde viemos buscar novas forças e renovar nossa fé para seguir produzindo e trabalhando no campo, porque a luta pela vida e a terra é diária e eterna”, explicou a assentada da reforma agrária Adriana de Almeida, 39 anos, enquanto acompanhava romeiros e romeiras na caminhada da 39ª Romaria da Terra.

O evento aconteceu na nesta terça-feira (9), em São Gabriel, na Fronteira Oeste do Rio Grande do Sul, região conhecia como o coração do latifúndio gaúcho, que tem em sua marca a monocultura de soja transgênica e o uso abusivo de agrotóxicos. Mas São Gabriel também tem histórias de luta e resistência: é onde as forças da segurança do Estado matou o Sem Terra Elton Brum da Silva, em 2009, durante reintegração de posse da Fazenda Southall. Hoje, o município conta com oito assentamentos e abriga 700 famílias Sem Terra que produzem arroz agroecológico e outros alimentos livres de venenos.

Foi em São Gabriel que também tombou o herói indígena Sepé Tiaraju e seus 1,5 mil companheiros que lutavam em defesa da terra, do seu povo e de uma vida pacífica em seu território. Esta edição da romaria, organizada pela Comissão da Pastoral da Terra (CPT-RS) com o apoio da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), Diocese de Bagé e Conselho Indigenista Missionário (Cimi), provocou a reflexão sobre os 260 anos do martírio, completados no dia 7 de fevereiro.


Na caminhada, cerca de 12 mil trabalhadores do campo e da cidade fizeram suas orações e acompanharam o legado deixado por Sepé e os indígenas massacrados. Ela iniciou na Sanga da Bica, no Centro da cidade, onde o herói foi morto, e encerrou no Parque Tradicionalista Municipal.

Durante o trajeto, ocorreram sete paradas em celebração às reduções jesuíticas: São Francisco de Borja, São Nicolau, São Miguel Arcanjo, São Lourenço Mártir, São João Batista, São Luiz Gonzaga e Santo Ângelo Custódio. Já no parque, romeiros e romeiras participaram de missa celebrada pelo bispo da Diocese de Bagé, Dom Gílio Felício.

Este ano a romaria teve como tema “Cuidar da Terra, Casa Comum”. Conforme Simonne Pegoraro, da coordenação da CPT-RS, além de lembrar o martírio de Sepé, o intuito foi refletir sobre a relação do homem com a terra e o meio ambiente diante da realidade de esgotamento, exploração e violência.


“Temos muito a aprender com os povos indígenas, quilombolas e camponeses, que têm em suas raízes o cuidado e a preservação da terra, e que não a vê como objeto de exploração, mas que se vê como parte dela”, argumentou Simonne.

Demarcação de terras indígenas
Integrando a programação da romaria, entre os dias 5 e 9 de fevereiro, para celebrar a luta de Sepé Tiaraju e discutir a questão indígena no Brasil, cerca de 700 índios Guarani e Kaiowá do RS, São Paulo, Mato Grosso do Sul e Argentina participaram do 10º Encontro do Povo Guarani.

Segundo o cacique Santiago Franco, da Aldeia Yuy Poty, localizada no município de Barra do Ribeiro (RS), o principal tema abordado foi a demarcação de terras no país, o qual corresponde hoje às mais importantes e urgentes bandeiras erguidas pelos indígenas.

“Nossa maior preocupação é com a demarcação do nosso território, que está paralisado por falta de atitude do governo. Nós vivemos com muitas dificuldades e queremos saúde, educação e que o governo reconheça nossa cultura e o direito que temos de viver como brasileiro e de termos liberdade”, disse Santiago.

Atualmente, segundo a Fundação Nacional do Índio (Funai), existem 462 terras indígenas regularizadas, que representam cerca de 12,2% do território nacional. Dados do Censo 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que 896,9 mil brasileiros se declaram ou se consideram indígenas.

Durante o encontro, foi construído um documento de reivindicações que será entregue à Funai, lideres governamentais do Brasil, Argentina, Paraguai e Bolívia – países onde há grande concentração de territórios Guaranis.

“Pedimos respeito e que possamos viver melhor. Estamos cada vez mais unidos porque o reconhecimento ao valor que nós temos é o nosso grande objetivo”, finalizou Santiago.

Acampamento da Juventude
Ainda em comunhão às temáticas da Romaria da Terra, ocorreu de 7 a 9 de fevereiro, também em São Gabriel, o 11º Acampamento da Juventude. O Evento envolveu desde oficinas, com debates sobre questões de gênero, agroecologia, agitação e propaganda, entre outros temas, até atividades de integração dos jovens do campo e da cidade.

“A nossa juventude tem um vínculo com a terra, mas precisamos cuidar dela, da natureza, da nossa casa comum. E esse compromisso e responsabilidade não é apenas de quem está no campo, mas também dos jovens da cidade”, declarou Liciê Scolari, da coordenação do acampamento.

A juventude ainda acompanhou análise de conjuntura com o coordenador nacional do MST, João Pedro Stedile. Ele levou para o centro do debate as crises econômica, social, ambiental e política do país e motivou os jovens a continuarem a luta por uma sociedade mais justa e igualitária.

“Estamos semeando em terra fértil e tenho certeza que todos vocês vão se tornar militantes da classe trabalhadora, para que o povo, com consciência, possa seguir a luta por uma sociedade mais justa e igualitária, assim como fez Sepé Tiaraju. Precisamos continuar essa batalha e eliminar todo o tipo de opressão e exclusão”, apontou Stedile.

Extraído da Página do MST (www.mst.org.br)

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016

A 39ª Romaria da Terra nos compromete com a vida da Terra e das Águas

Esta 39ª Romaria da Terra nos compromete com a vida da Terra, das Águas e, sobretudo, de todas as vidas que nelas habitam, vida que estão ameaçadas, vidas dos pobres e dos pequenos, em primeiro lugar.
Este compromisso com a responsabilidade social e ambiental tornou-se um refrão incansavelmente repetido e propagandeado na hora da implantação dos grandes projetos. Não vi um Estudo de Impacto Ambiental – EIA que não garantisse tudo isso. Nunca vi um EIA que chegasse, no fim, a desaconselhar a implantação de um grande projeto. Sempre, nas audiências públicas, prova-se que as empresas, além de querer seu lucro, se comprometem com o bem social e a proteção, a preservação ou a recuperação ambiental.
Governos, empresários e ONGs parecem estar todos falando uma mesma língua. A preocupação com a ecologia, com o meio ambiente parece ser, hoje, um fato indiscutível e que deve sempre ser levado em conta. A teologia, a hermenêutica bíblica, a moral, também, entraram com força nesta reflexão que cinqüenta anos atrás, no Concílio, nem mesmo estava em pauta.
O que diz a bíblia das questões ecológicas? Quantas vezes, nestes últimos anos ouvi esta pergunta! E não há como esconder que os textos bíblicos dizem uma coisa e se contradizem logo em seguida, uma vez que provêm de ambientes diferentes, com preocupações e projetos diferentes.
Salomão ofereceu a Javé para o sacrifício pacífico, vinte e duas mil vacas e cento e vinte mil ovelhas (1Rs 8,63). Esta incrível matança de animais acompanhou a inauguração do templo de Jerusalém. Depois vieram os holocaustos quotidianos, os inúmeros sacrifícios de todo tipo, as ofertas e os sacrifícios pelos pecados. Para todos estes sacrifícios os sacerdotes, “porão fogo sobre o altar, ordenando a lenha sobre o fogo”. (Lv 1,7): fogo para queimar incenso, para assar as carnes, para consumir os holocaustos e para cozinhar os “santos dos santos”, as comidas exclusivas dos sacerdotes; fogo que nunca podia se apagar (Lv 6,13). Foi preciso estabelecer um rodízio entre as famílias para o fornecimento da lenha a ser queimada sobre o altar (Ne 10,34). E tudo isto numa região semi-árida como a Judéia, onde até o orvalho era considerado uma bênção de Deus.
Reis e sacerdotes ergueram templos e palácios explorando o trabalho de milhares de pessoas e cortando inúmeras árvores do Líbano. Como todos os poderosos, não tinham nenhuma preocupação com a vida nem da natureza nem das pessoas.
Nesta perspectiva, por exemplo, foi e continua sendo lida a bênção de Deus ao homem e à mulher: Frutificai e multiplicai-vos e enchei a terra e sujeitai-a; e dominai sobre os peixes do mar, sobre as aves dos céus e sobre todo o animal que se move sobre a terra. (Gn 1,28)
Uma interpretação literal deste “domínio” justificou a propriedade privada, legitimou uma equivocada centralidade do homem sobre a natureza e embasou, teologicamente, a chamada civilização ocidental/cristã que vem explorando a natureza até sua exaustão.
E a “imagem de Deus”, muitas vezes, tornou-se grileiro de terras, destruidor de florestas, explorador do trabalho escravo e financiador da pistolagem. Um exército devastador e assassino, cuja violência está retratada em todas as páginas da história humana e que nada tem a ver com a mensagem evangélica.
Como saber, então, o que deveria fazer a diferença?
Ecumenismo, economia, ecologia
Trabalhar as palavras pode parecer – e às vezes é – um trabalho inútil dos sabichões. Às vezes vale a pena. Vou tentar ser simples e concreto.
As palavras economia, ecologia e ecumenismo vêm todas da língua grega e se originam do verbo “oikeo”: habitar. O substantivo derivado é “oikoumene”.
Esta palavra foi, logo, entendida como “todo o universo habitado”, “toda a sociedade humana”, “toda a terra”, A esta palavra costuma-se dar uma dimensão universal.  
É, porém, interessante notar que a palavra oikoumene nunca aparece nos textos paulinos. Apesar de sua preocupação universalista Paulo não usa esta palavra. Para entender isso, é preciso considerar o uso político desta palavra que era feito no mundo cultural grego e romano. Para gregos e romanos a palavra oikoumene indicava, quase sempre, as populações que eram conectadas com seu projeto político e comercial. Os bárbaros e os escravos não faziam parte da oikoumene.
Oikoumene que parecia ser uma palavra includente, tinha, na realidade, um forte sentido de exclusão. Uns eram oikoumene e outros não.
Esta ambigüidade justifica a ausência desta palavra nos textos paulinos. Suas afirmações são claras:
Eu sou devedor tanto a gregos como a bárbaros, tanto a sábios como a ignorantes (Rm 1,14)
Não há grego, nem judeu, circuncisão, nem incircuncisão, bárbaro, cita, escravo ou livre; mas Cristo é tudo em todos (Cl 3,11).  
O Reino de Deus é uma coisa, a oikoumene é bem outra (ver também, Mt 24,14; Lc 4,5; 21,26): a ela deve ser anunciado o evangelho do Reino.
Temos que dizer que também a palavra kosmos, sobretudo em João, não tem o significado global de mundo, de universo, mas identifica as forças negativas que se contrapõem ao Reino.
É bom lembrar que esta ambiguidade se mantém, também, nos tempos atuais: a palavra ecumenismo – que deveria significar a atitude de encontro e de respeito entre todos os que vivem no mesmo mundo habitado - é quase sempre usada para falar da unidade das igrejas cristãs, excluindo do ecumenismo as demais expressões religiosas. Para estas foi preciso criar a palavra macro-ecumenismo: uma evidente redundância.
Por que fiz toda esta explanação? Porque do verbo oikeo, derivam, também, as palavras oikiaoikos: habitação, casa, residência, lugar habitado, família.
oikoumene é o conjunto das “casas”, de todos os espaços que são habitados. Não há como separar o universal do local.
Precisamos, porém, levar em consideração que casa, também, nunca foi sinônimo dos que habitam nela. Tem o homem e tem a mulher, tem o pai e tem o filho, tem o amo e tem o escravo. As relações internas da casa são determinantes, podem ser igualitárias, segundo diz Paulo:
Não há judeu nem grego; não há servo nem livre; não há macho nem fêmea; porque todos vós sois um em Cristo Jesus (Gl 3,28).  
Ou as relações dentro da casa podem ser de domínio, de governo:
Todos os escravos que estão debaixo do jugo estimem os seus senhores dignos de toda a honra, para que o nome de Deus e a doutrina não sejam blasfemado (1Tm 6,1).
As mulheres idosas (...) ensinem as mulheres novas a serem (...) boas obreiras de casa, submetidas a seus maridos, a fim de que a palavra de Deus não seja blasfemada (Tt 2,3-5).
Quanta diferença entre o homem: dono/patrão da casa (oikodespotes) e a mulher trabalhadora da casa (oikourgous)!
Ecologia vem do grego: oikos = casa e logos = discurso. Diga-se o mesmo da economia que vem de oikos = casa e nomos = lei, norma. É por isso que precisamos definir qual é a nossa “ecologia”.
Ecologia é dizer o que pensamos da nossa casa, como um todo. Quase sempre – e, nisso, empresários e ambientalistas são iguais – se entende ecologia como a nossa relação com a natureza, com o meio ambiente, podemos dizer com o nosso “quintal”. Discute-se o ambiente, discute-se como deve funcionar o quintal, mas não se discute que tipo de casa nós queremos.
Tem muitos ecologistas que, quando pensam em casa, continuam pensando em “casa grande” e em “senzala”. Não pensam numa casa comum, onde todos sentam ao redor da mesma mesa e repartem o mesmo pão, sem distinção.
Eles se preocupam só com o quintal, com a natureza, com o ambiente que está fora da casa e, assim, falam em desenvolvimento sustentável, em defesa da terra e da água, mas continuam sem por em discussão a “casa grande” dos países mais ricos, das classes dominantes, das corporações industriais e financeiras, das elites privilegiadas e corruptas que engordam às custas de uma imensa, incalculável “senzala” que é explorada, oprimida, excluída.
A eterna luta entre Iahweh e o Faraó (a casa grande)
A senzala ainda não saiu da cabeça de muitos. Precisamos nos converter, pois a economia (a lei, a organização, a administração da casa) vai depender da ecologia (de que casa estamos falando, em que tipo de casa queremos viver).
Não vamos esquecer que a palavra faraó significa, literalmente, “casa grande”.
Se continuarmos a acreditar na casa grande, teremos uma economia centrada na especulação financeira, nos monopólios industriais, na privatização dos serviços públicos - realidades que nada teriam a ver com a ecologia. Uma economia baseada no agronegócio, na monocultura, na mineração, nas exportações de matéria prima, no trabalho escravo, na concentração fundiária, nas sementes transgênicas, nos agrotóxicos.
A casa grande ficará com os produtos e os lucros; a senzala ficará com o trabalho e as migalhas da assistência social e o quintal será devastado. Os pobres perderão a terra! A terra perderá a vida!
Tudo depende da maneira de olhar a terra, a água, a natureza: socialistas e capitalistas enxergam tudo isso como matéria prima que adquire seu valor ao virar mercadorias que deve ser comercializada e privatizada, deixando de ser direito e bem coletivo.
Nós queremos olhar a terra, a água, a natureza como a nossa casa, a nossa mãe e fonte de vida para todas as criaturas.
Nós entendemos que a luta pela terra é, hoje de maneira especial, luta pela TERRA, com a T maiúscula. É a luta pela vida do planeta que é violentamente ameaçada por um falso conceito de crescimento, desenvolvimento, progresso e por uma ainda mais falsa ideia de que os recursos naturais são infindáveis.
Aprender com as comunidades indígenas e quilombolas o que significa uma casa feita tenda comum, aberta a todos, não significa atraso. Significa vida abundante para todos e todas.
Lutar pela terra e pela vida da Terra é um imperativo ético que testemunha nossa fidelidade à memória, à tradição, à ancestralidade, às nossas raízes. É nossa fidelidade aos pobres de Deus.
Lutar pela terra e pela vida da Terra é uma exigência que testemunha nossa relação sagrada com a terra, nossa mãe, nossa amiga, nossa amante, à qual devemos “servir” e “obedecer”[1] pois dela todas as gerações terão vida em abundância. É nossa fidelidade à terra de Deus e de todos e todas nós.
Lutar pela terra e pela vida da Terra é uma obrigação que testemunha a fé no nosso Deus. Da ecologia, depende não só a economia, mas, também, a teologia. A casa que pensamos e queremos determina qual é o Deus ao qual nossa casa deve ser fiel. É nossa fidelidade ao Deus dos pobres.
Este testemunho de fidelidade ao Deus dos pobres, aos pobres de Deus e a terra que é de Deus e de todos, levou inúmeras companheiras e companheiros a amar até o fim, até derramar seu sangue. São os mártires/testemunhas que as igrejas nunca devem esquecer. Entre eles, celebramos a memória de São Sepé Tiarajú.  
A “casa grande” em nossas cabeças e em nossos corações
Ao lutarmos com dedicação pela vida da TERRA, precisamos, no mesmo tempo, cuidar de alimentar uma mística adulta e sólida que nos ajude, não só a derrotar o faraó que nos oprime, mas, também, a vencer o “faraozinho” que carregamos dentro de nós e de nossas organizações e contra o qual ninguém foi ainda vacinado.
Os movimentos e as organizações populares, às vezes se deixam levar na conversa dos interesses partidários; muitas lideranças, também, acabam aceitando, como inevitáveis, os esquemas de corrupção, disputam ferozmente cargos de confiança e acreditam, simplesmente, que a maneira de sair da senzala é entrar a fazer parte da casa grande. “Agora chegou a nossa vez” dizem.
Nossas igrejas, muitas vezes, seguiram e seguem a lógica da casa grande e da senzala que deturpou nossas relações: templos, altares, sacrifícios, hierarquias, governos são coisa da casa grande, de um sacro-negócio blasfemo e diabólico, o mesmo que, aliado ao império opressor, condenou à morte Jesus de Nazaré.
O evangelho do Reino de Deus nos convida a fazer a diferença dentro e fora da igreja: casa, mesa, pão repartido e serviço devem substituir templos, altares, sacrifícios e dominações. Foi isso que Jesus celebrou na ceia. É isso que devemos continuar testemunhando em memória dele e de seu martírio.
Pão repartido quer dizer terra repartida, bens partilhados, luta contra toda concentração, contra o latifúndio excludente, devastador e violento. É a defesa da vida contra todas as formas de escravidão, mesmo as que são mascaradas de crescimento e são chamadas de mercado.
Pão repartido é crer que nossa casa é uma oca comum ou, usando a linguagem bíblica, uma “tenda”. Nem palácios, nem templos, nem quartéis, nem armazéns, nem bancos, nem especulações financeiras.
Vamos repetir uma vez mais: a palavra faraó significa “casa grande”.
O nosso Deus, o Deus dos nossos pais e das nossas mães, o/s deus/es dos nossos povos ancestrais nunca estará na casa grande, apesar dos templos gigantescos que eles construíram e continuarão construindo.
Iahweh será sempre o Deus dos hebreus, dos marginalizados que só querem viver em paz, podendo desfrutar do fruto da terra e do seu trabalho, do pão e do vinho que ofertamos ao Senhor para que seja sempre de todos e de todas.
Ecologia e Reino de Deus
Mesmo sabendo que os textos bíblicos nunca usam a palavra ecologia que nem está no dicionário grego e mesmo sabendo que a palavra reino parece ser tão obsoleta em nossos tempos considerados democráticos, precisamos aprofundar mais um pouco o que é o centro do anúncio de Jesus: O tempo se completou e chegou o reino de Deus, mudai de pensamento e acreditai no evangelho (Mc 1,15).
A justiça do Reino que deve ser procurada em primeiro lugar (Mt 6,33) é uma proposta clara, uma proposta cuja vivência levou Jesus à perseguição e ao martírio.
A vida dos pequenininhos deve estar sempre em primeiro lugar. Ela vale mais do que a lei, mais do que o templo, mais do que os interesses do mercado e do império.
A lógica econômica é aquela da mesa, do dividir, dar e distribuir e não aquela do mercado, do comprar e vender.
As relações políticas estão marcadas pelo serviço e pelo dar a vida e não pelo domínio e pela opressão.
Esta é a casa que Jesus quis edificar: uma casa muito diferente do palácio de Herodes, do quartel de Pilatos, da sinagoga dos escribas e do templo dos sumos sacerdotes.
Uma casa onde encontram a cura a sogra de Pedro, o criado do centurião, a filha da mulher siro-fenícia; uma casa destelhada para que o paralítico possa ser descido até diante de Jesus. Uma casa onde Jesus come com os publicanos e os pecadores; uma casa onde Jesus "acorda" a menina de doze anos, e manda dar-lhe de comer.
Uma casa na qual a família não é constituída por vínculos de sangue: irmãos, irmãs e mãe de Jesus são todos e todas que sentam ao redor dele e fazem a vontade do Pai. Uma casa na qual o profeta não é honrado pelos seus (Mc 6,4).
É a casa onde Jesus desafia os discípulos colocando-os diante de um menino: quem quiser ser o primeiro seja o último e o escravo de todos. A casa onde Jesus provoca os discípulos a colocar os direitos das mulheres na frente dos deles.
É a casa de Simão, o leproso, onde a unção de uma anônima mulher o consagra e lhe dá a coragem de enfrentar a morte: único evangelho a ser anunciado em todos os lugares da terra, em memória dela: aos pobres terão que fazer o bem.
É a casa indicada pelo escravo, carregador de água, na qual o grupo de Jesus celebrará a sua Páscoa: o memorial vivo de Jesus que substituiu definitivamente o templo com a casa, substituiu o altar com a mesa e substituiu os sacrifícios com o pão e o vinho repartidos entre todos.
Uma casa e uma mesa na qual Jesus está como aquele que serve, como aquele que lava os pés.
Uma casa, uma mesa, na qual Jesus poderá ser reconhecido ao partir o pão.
E, por fim, uma casa, Betânia, a casa dos oprimidos, o último lugar onde Jesus vai conduzir seus discípulos antes de ser elevado ao céu.
Esta é a “ecologia” do Reino: o discurso/logos que os evangelhos fazem sobre a casa/oikos.
A economia a serviço da casa
A economia, as leis da casa, a administração da casa é o compromisso de ajudar a viver conforme o projeto de casa na qual queremos viver. É impossível separar a economia da ecologia. Quem faz isso precisa reduzir a ecologia a uma relação mais ou menos sustentável com o quintal.
Aí a casa deixa de ser o referencial. O referencial último e definitivo é o mercado. E, no nome dele e na obediência a ele, tudo é justificado ou justificável.
É aqui que nós, os que, com a força do Espírito Santo, queremos ser discípulos e missionários de Jesus, precisamos fazer a diferença.  Temos que ter claro que quando denunciamos e combatemos o desmatamento, o agronegócio, os agrotóxicos, o latifúndio, a contaminação, a mineração colonialista, a pesca predatória, as barragens, o trabalho escravo, as megalópolis estressantes, a violência, o narcotráfico, a corrupção do estado, em todos os seus poderes, o fazemos movidos por profundas razões místicas: porque acreditamos firmemente que em toda a criação circula uma única vida, a vida de Jesus:
Ele é a imagem do Deus invisível, o primogênito de toda a criação; porque nele foram criadas todas as coisas nos céus e na terra, as visíveis e as invisíveis (...). Tudo foi criado por ele e para ele.  Ele existe antes de todas as coisas e todas as coisas subsistem por ele (Cl 1, 15-17).
Este projeto cósmico universal que envolve tudo o que existe a partir de uma única vida é a oikoumene que nós queremos, na qual habitamos e que queremos fortalecer.
Querer que ao nome de Jesus se dobre todo o joelho dos que estão nos céus, na terra e debaixo da terra e que toda a língua confesse que Jesus Cristo é o Senhor (Fl 2,10s) é viver numa só casa, é o ecumenismo que move nossas relações.
Pôr-se a serviço de todas e de todos, para que todas e todos tenham vida e a tenham em abundância, sem nenhuma exclusão de religião, de bandeira, de raça, de classe, porque o único senhor diante do qual queremos nos ajoelhar é a ecologia que queremos defender e testemunhar com toda a nossa vida: é a casa em que queremos nos encontrar.
Olhar para os pássaros do céu, para as flores do campo, não nos deixando enganar pelos armazéns e pelas roupas suntuosas dos magnatas dos bancos, das indústrias, da mineração, do agro e do hidro-negócio, da corrupção é nosso maior critério de economia:
Ninguém pode servir a dois senhores; porque ou há de odiar um e amar o outro ou se dedicará a um e desprezará o outro. Não podeis servir a Deus e a Mamom (...). Não andeis, pois, angustiados, dizendo: Que comeremos ou que beberemos ou com que nos vestiremos? Porque todas estas coisas as nações procuram. O vosso Pai celestial bem sabe que necessitais de todas estas coisas; buscai primeiro o reino de Deus e a sua justiça e todas estas coisas vos serão acrescentadas. (Mt 6,24, 31-33)   
Parecem palavras de um louco, palavras que poucos levaram a sério em 20 séculos de história. Palavras que nações e igrejas, muitas vezes, esqueceram.
Que esta nossa Romaria seja marcada pela renovação do nosso compromisso com a ecologia da Terra sem Males.




[1] Esta é a tradução literal dos verbos que estão em Gênesis 2,15 e que nossas bíblias costumam traduzir com “cultivar” e “cuidar”.
Sandro Gallazzi