Uma das nossas principais contribuições para a sociedade brasileira foi cumprir com nosso compromisso em produzir alimentos para o povo brasileiro. Fruto da organização de mais de 100 cooperativas e mais de 1.900 associações em nossos assentamentos, trabalhamos de forma coletiva para produzir alimentos.
Contribuímos também na construção de 96 agroindústrias, que melhoram a renda e as condições do trabalho no campo. O assentamento é um espaço em que um conjunto de famílias camponesas vive, trabalham e produzem, dando uma função social à terra e um futuro melhor à população.
A vida no assentamento garante às famílias direitos sociais que não são garantidos a todo o povo brasileiro: casa, escola e comida. O impacto da criação de um assentamento marca a vida de um município, tanto do ponto de vista social como econômico. Em primeiro lugar, a terra ganha uma função social. Em segundo lugar, um conjunto de famílias ganha instrumentos para a sua sobrevivência. Depois de um período, constroem a casa, conquistam a escola e começam a produzir. A produção garante o abastecimento de alimentos aos moradores das pequenas cidades e gera renda às famílias assentadas.
Um bom exemplo dos resultados da Reforma Agrária trata-se da antiga Fazenda Anonni, área de 9 mil hectares que foi desapropriada em 1986 no Rio Grande do Sul. Foram assentadas 420 famílias no assentamento da Anonni, que produzem, por ano, cerca de 20 mil sacas de trigo, 13 milhões de litros de leite, 150 mil sacas de soja, 35 mil sacas de milho, 45 toneladas de frutas, 800 cabeças de gado, 5 mil cabeças de suínos e 10 mil quilos de hortaliças. Por isso, 23 prefeitos da região norte do estado defendem a desapropriação de fazenda em Coqueiros do Sul, que ocupa 30% da área do município e gera empregos para apenas 15 funcionários temporários, além de ser um símbolo do atraso e da exclusão. Caso fosse transformada em um assentamento para 450 famílias, poderia gerar no mínimo 950 empregos diretos, desenvolver a produção e movimentar a economia da região.
A expressão “assentamento” é utilizada para identificar não apenas uma área de terra no âmbito dos processos de Reforma Agrária, destinada à produção agropecuária e ou extrativista. É também um espaço heterogêneo de grupos sociais constituídos por famílias camponesas, que ganha vida depois de desapropriado ou adquirido pelos governos federal ou estaduais, com o fim de cumprirem as disposições legais. O assentamento representa o desfecho de um determinado processo político-social onde o monopólio da terra e o conflito social são superados e imediatamente inicia-se um outro: a constituição de uma nova organização econômica, política, social e ambiental com a posse da terra, por uma heterogeneidade social de famílias camponesas. Por isso, deve-se compreender os assentamentos como expressão de um impasse da luta social.
Por um lado, os assentamentos unem o homem à terra e nela desenvolvem o trabalho com sua família. Por outro lado, em um contexto de avanço do modelo agroexportador com prioridade à produção em grandes áreas para exportação, os assentamentos ainda não realizam plenamente suas potencialidades. Infelizmente, por conta dos limites das políticas dos governos, os assentamentos não se constituem como expressão de uma política ampla e massiva de democratização da terra no Brasil. Atualmente, são criados dentro de uma programa de políticas sociais e resolução de conflitos, em vez de fazer parte de uma estratégia de desenvolvimento focado no mercado interno, tendo na reforma agrária um de seus elementos estruturadores. Esse impasse é muito desfavorável aos trabalhadores e se revela quando analisamos as omissões dos sucessivos governos quanto às suas obrigações contraídas junto aos assentamentos.
Pesquisas sobre a qualidade de vida nos assentamentos constaram que os formados entre 1995 a 2001 careciam de diversas estruturas sociais e serviços públicos. Por exemplo: 32% dos assentamentos não tinham casa definitiva; 49% não possuíam água potável; 55% não possuíam eletricidade; 29% das famílias com filhos em idade escolar não tinham acesso à escola de ensino fundamental; 77% não tinham acesso ao nível médio; 62% dos assentamentos não tinham atendimento de saúde emergencial. O passivo social nos assentamentos é enorme, o que reforçou a necessidade das lutas reivindicatórias por políticas públicas e justifica a sua intensificação nos anos 90 e 2000.
Apesar da ausência das ações governamentais dentro dos assentamentos, a condição de vida destas famílias mudou para melhor. Estudos revelam uma melhoria da vida das famílias assentadas dadas suas condições anteriores vividas. Uma pesquisa aponta que 66% das famílias pesquisadas apresentam uma melhora no padrão de sua alimentação; 62% perceberam uma melhora no seu poder de compra, sobretudo de bens duráveis e 79% dos entrevistados viram melhoras na forma de habitação. Outro dado revelador da pesquisa referiu-se à confiança no futuro por parte destas famílias, 87% delas acreditam que o futuro será melhor.
Estimulamos também as famílias assentadas a organizar agroindústrias de forma cooperativada, que é uma ferramenta fundamental para agregar valor à matéria- prima produzida, garantindo uma renda mensal aos associados; assegurando preços aos produtos e viabilizando a comercialização da produção. Estamos convencidos que o desenvolvimento do campo virá com a interiorização da agroindústria, gerando alternativas de trabalho para a juventude e para as mulheres. Os assentamentos podem resolver as necessidades concretas das famílias, criando condições para o trabalho, para a produção e moradia, ou seja, organizando a economia e as dimensões da vida social, educacional e cultural das famílias assentadas. Busca-se com isto a elevação do nível educacional, cultural de todas as famílias.
Desta forma, os assentamentos são a grande contribuição deste movimento social, o Movimento Sem Terra, para a sociedade brasileira. Buscamos em cada assentamento desenvolver uma mentalidade e uma atitude de Soberania Alimentar, compreendendo que a nossa função social é produzir alimentos, sendo esta a nossa primeira tarefa histórica, eliminando a fome do meio das famílias camponesas. Buscamos também desenvolver a cooperação agrícola, como um ato concreto de ajuda, que fortaleça a solidariedade, mas também potencialize as condições de produção das famílias assentadas.
Fazemos esforços nas áreas de educação e saúde. As famílias assentadas têm o compromisso de promover a agroecologia cooperada que crie a base material e técnico-científica para repensarmos as nossas relações com a natureza e com os demais seres humanos, e que eleve a produtividade física dos solos e a produtividade do trabalho. Defendemos a diversificação produtiva, que modifica nossos hábitos e atitudes frente à natureza e alterando nossos hábitos de consumo e de alimentação.
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